05/02/09

O autocarro ateísta e outras histórias

(Escolham, dos dois subtítulos que proponho, o que mais vos agradar:)
Não batas mais na velhinha ou Ele a dar-l’e a burra a fugir

1. O nome e a coisa:Diz Filipe Pereirinha[1], a propósito da primeira campanha publicitária ateísta[2], que «Saramago – um ateu, por sinal – [disse] que Deus não desaparecerá enquanto não desaparecer o nome de Deus. Mesmo que Deus não exista, que seja um puro vazio, enquanto a linguagem o fizer ex-sistir, Deus ex-sistirá. Certainly! A frase escrita no autocarro [da campanha, “there’s probably no god”] é uma prova da existência de Deus». É uma retórica conhecida e, a julgar pela fortuna que tem, sedutora, mas é só mesmo isso. Se não… eu amanhã vou começar a dizer a toda a gente que não fale mais de malária. Se nunca mais o nomearmos, havemos de erradicar o parasita.

É um abuso, eu sei, o que eu estou a fazer, mas também é um abuso reduzir a existência de Deus (ou dos gnomos, das fadas, dos unicórnios ou dos leprechauns, para o caso tanto faz…) à sua nomeação, sobretudo porque quem acredita na existência de deus não é na existência dele como nome que acredita. Aliás, há até quem acredite na coisa-deus sem acreditar na possibilidade da sua nomeação. Por outras palavras, a discussão entre ateístas e teístas é uma discussão sobre a existência de facto de uma entidade com as características que estes últimos atribuem aos seus deuses.

2. Mais vale ignorá-los do que dar-lhes importância
Há, porém, outra leitura (mais interessante, talvez…) que se pode fazer das palavras de Saramago citadas por Pereirinha: é que é má estratégia da parte dos ateístas passar a vida a discutir a existência de Deus. Há muitos ateus que insistem nisso: «Deixem estar isso, não batam mais na velhinha, é vocês a darem-lhe e a burra a fugir…», dizem eles, «A única coisa que conseguem assim é dar a deus uma importância que ele não tem». A discussão aqui é, pois, de estratégia política. Tenho visto nos últimos tempos acusações a Richard Dawkins, a Sam Harris, ao falecido George Carlin e outros proeminentes ateístas militantes de, pela sua “intolerância” ou pela sua “agressividade”, terem contribuído mais para a causa religiosa do que os próprios religiosos. Mas não concordo. Vi seguirem-se estratégias de abstenção da discussão em relação a outras questões e com maus resultados. Estou convencido, por exemplo, de que uma das razões para o crescimento da extrema-direita racista na Europa, nos anos 90, foi a recusa dos não-racistas de se “rebaixarem” ao ponto de discutir em público com ela...

3. Orgulho ateu?
Pereirinha diz também que “vivemos na época da marcha e do orgulho; coube, desta vez, ao orgulho ateu fazer também a sua marcha”. Orgulho? Mas orgulho por quê ou em quê? A história da campanha publicitária ateísta, explica o seu site, é a seguinte (traduzo eu):

A campanha começou quando a escritora de comédia Ariane Sherine viu um anúncio, num autocarro londrino, em que se citava uma frase da Bíblia, “Quando o Filho do Homem vier, será que encontra Fé nesta Terra?” [sic]. Abaixo da citação, havia um URL, e quando Sherine visitou o respectivo site ficou a saber que, não sendo crente, seria “condenada à eterna separação de Deus e passaria toda a eternidade em tormento no inferno”.

Orgulho ateu? Então uma pessoa estar sempre a levar com estas e outras campanhas de terrorismo mental não é razão mais do que suficiente para reagir? Toda a gente refere agora (porque é, como dizer?, giro… pois, fora do vulgar, divertido até...) a campanha ateísta, mas não me lembro de haver muita gente a referir os milhares de campanhas publicitárias religiosas que houve e há por esse mundo fora. Um dos méritos desta campanha é precisamente fazer notar às pessoas o estranho que é para elas alguém fazer o contrário daquilo a que estão habituadas, que é evangelização a torto e a direito.

Mostra de orgulho? E por que não legítima defesa? Uma verdade simples e demasiado ignorada é que os ateus são sistematicamente discriminados. Fala-se muito hoje da liberdade de crença e culto, como se fosse a crença e o culto a única opção possível, mas ninguém fala da liberdade de cultivar activamente a negação da existência de deuses e toda a classe de superstições. A constituição e as leis de diversas nações reconhecem a todas as religiões os mesmos direitos, em termos de educação, por exemplo, mas nunca mencionam os direitos dos ateus (nos países onde se pode escolher para os filhos educação moral e religiosa, posso requisitar para o meu filho um professor de ateísmo?). Os parágrafos sobre blasfémia (que presumo que incluam a asserção simples de que “Deus não existe”, como é que isso pode não ser blasfémia?) existem nas leis de vários países muito democráticos e muito progressistas; mas eu não posso levar ninguém a tribunal por ter afirmado que deus há-de punir o meu racionalismo com eterno sofrimento, uma asserção que me ofende profundamente… A esmagadora maioria dos atlas e das páginas de factos sobre os diversos países e áreas geográficas menciona a percentagem de praticantes das várias religiões, mas muito raramente se menciona o número de ateus e agnósticos – mesmo quando, como no caso de Moçambique, um quarto dos cidadãos declararam, no último censo, não terem nenhuma religião. Há muitos estados oficialmente religiosos e vários estados laicos, mas não conheço nenhum estado oficialmente ateu ou agnóstico [3]. Orgulho ateu? Nós estamos é fartos, muito sinceramente.

4. Ciência, racionalismo, religião e democracia: a questão moral
Outra discussão interessante, aflorada também por Pereirinha no seu texto, é a da palavra probably no anúncio inglês. «Para quem leu Nietzsche ou Dostoiévski», diz ele, «este “probably” está a mais.» Bom, de certeza que não é só para quem tenha lido Nietzsche ou Dostoiévski que o probably pode estar a mais. Mas o facto é que ele não está a mais para muitos ateístas. A palavra é um indicador claro de uma atitude que o racionalismo ateísta não partilha com as crenças religiosas – uma diferença moral. Na já referida página FAQ do site da campanha, uma das “perguntas frequentes” a que se responde é «Por que é que só “provavelmente” não há deus?». A resposta:

Tal como acontece nos famosos anúncios da Carlsberg («provavelmente a melhor cerveja do mundo»), “provavelmente” contribui para garantir que os nossos anúncios não infrinjam regras de publicidade. A Comissão da Prática Publicitária informou a campanha de que «a inclusão da palavra “provavelmente” torna a campanha menos susceptível de ofender, e, portanto, de quebrar o Código da Publicidade».

Disse Ariane Sherine: «Também gosto de “provavelmente” por outra razão: significa que o slogan é mais rigoroso, uma vez que, embora não exista prova científica da existência de Deus, também é impossível provar que Deus não exista (ou que outra coisa qualquer, seja ela qual for, não existe). Como Richard Dawkins diz em The God Delusion, dizer que “Deus não existe” é assumir uma posição de “fé”. Escreve ele: “Os ateus não têm fé; e a razão apenas não pode dar a ninguém a perfeita convicção de que uma coisa definitivamente não existe”. As palavras que ele usa no livro são “almost certainly [quase de certeza]”; mas, embora isto reflicta mais directamente aquilo em que crê a maior parte dos ateus, “probably” é mais curto e soa melhor, o que ajuda em publicidade”.

Aliás, acrescento agora eu, é evidente que provar a existência de Deus, altamente improvável à luz do que se pode verificar do funcionamento do mundo, nem sequer compete a quem dela duvide, mas antes a quem nela creia. O que muitos ateístas dizem é que, porque têm uma atitude permanentemente aberta a tudo o que é verificável ou de qualquer forma demonstrável, estão dispostos a mudar de opinião, se alguém lhes der uma boa razão para acreditarem na existência de algum deus.. Mas nenhum religioso a dá, porque a prova que cada crente tem do seu deus não é observável por ninguém que não partilhe a sua crença e chama-se fé… Evidentemente, os religiosos não acreditam na boa-fé (credo!) dos ateístas. Não conseguem imaginar uma mente menos fechada do que a sua [4]

É curioso: discute-se mais a oposição entre o racionalismo científico e a religião enquanto formas de conhecer e explicar o mundo do que enquanto sistemas morais. Ora, para um moralista como eu, por muito que seja importante discutir o valor de verdade das propostas de explicação do mundo, interessa também sempre, e muito, discutir a justeza das propostas de códigos de comportamentos – porque elas afectam directamente a vida da gente, não é?

E creio que há, de facto, uma grande diferença moral entre quem acredita na racionalidade e quem acredita na fé: os racionalistas acreditam que o conhecimento da verdade é algo perecível e frágil, que se vai acumulando devagarinho, muito devagarinho, com paciência e trabalho de rigor, e têm sempre o cuidado de o procurar no que pode ser partilhado por todos os seres humanos. Para eles, o valor de verdade de uma afirmação pode sempre ser discutido e pode-se sempre provar que, afinal, a verdade proposta não o era. E isto aplica-se tanto às descrições dos fenómenos do mundo como aos conjuntos de normas de comportamento de uma sociedade. Para um religioso (lato sensu), não há nada a discutir: o mundo está explicado a priori e estão definidas à partida as maneiras correctas e incorrectas de agir, que lhe foram reveladas por entidades sobre-humanas.

Uma diferença moral, dizia eu: quem acredite que todos os seres humanos têm o mesmo direito a participar na discussão do mundo e das linhas com que ele se cose não pode deixar de constatar que, à religião, lhe faltam modéstia e democraticidade.



5. Um sonho:
Isto não tem nada a ver com o texto de Filipe Pereirinha, é só para terminar num tom mais alegre. Como a discussão da compatibilidade do conhecimento científico com a crença religiosa não só não acabou como parece estar cada vez na ordem do dia (vejam, por exemplo, a recensão de Jerry Coyne no New Republic de Saving Darwin: How to be a Christian and Believe in Evolution, de Karl W. Giberson e Only A Theory: Evolution and the Battle for America's Soul, de Kenneth R. Miller), conto-vos um sonho que tive:

Era um tipo qualquer com uma cara diferente da minha, mas que eu reconhecia como sendo eu próprio, a falar com outro tipo com outra cara diferente, tanto da do primeiro tipo como da minha, mas que eu continuava a reconhecer como sendo eu próprio (os sonhos têm destas coisas…). E perguntava a primeira à segunda cara:

Mas afinal, pode um cientista crer em deus?

E respondia a segunda cara à primeira:

Pode, pois claro que pode. Um cientista é como as outras pessoas, acho eu, pode fazer tudo o que lhe apetecer, desde que não prejudique mais ninguém. Até pode comer sardinhas assadas com doce de groselha. O problema é dele…

_________________

[1] Embora não o veja já há muito tempo, é um rapaz que eu conheço e por quem tenho simpatia. Este texto é só a saudável expressão de um desacordo.

[2] Explico a distinção que faço entre ateísta e ateu: chamo ateu a quem não acredite em deuses, sem mais; mas chamo ateísta a alguém que professa o ateísmo como filosofia e, sobretudo, que tem uma posição proactiva, como agora se diz, na discussão entre religião e racionalismo não religioso. A distinção dá jeito, até porque permite estabelecer a oposição simples teísta vs ateísta, que não funciona com a palavra ateu.

[3] Talvez o Butão, o Camboja e a Tailândia, porque são oficialmente budistas e, para os budistas, não existe propriamente um deus… Seja como for, não acho que deva haver estados ateus, prefiro a noção de estado laico, mas é só para vocês verem como as coisas andam.

[4] Se bem que, como tem sido frequentemente argumentado, todos os seres humanos sejam ateus: todos duvidam de existência de alguns deuses, mesmo que acreditem noutros. Mas isso é uma questão que deixamos os religiosos discutirem entre eles; nós, ateus, já demos um passo em frente, e passámos a duvidar de um deus mais (ou de um grupo de deuses mais) do que cada religioso…

9 comentários:

Filipe Pereirinha disse...

Dizia Lacan que o "triunfo da religião" se deve ao facto de ela despejar "sentido" no "real" cada vez mais difícil de suportar. Deus não existe? Probably! Mas a religião encarrega-se de "relativizar" a coisa, absolutizando a via do sentido.
Um abraço e parabéns pelos blogues.

Anónimo disse...

Muito bem, ó Vitor. Queria dizer-te que o "probably" (consultar os arquivos do Guardian) não nasceu duma questão filosófica mas muito simplesmente legal. E, quanto a mim, não fica lá nada mal.

Como não quero para aqui lacanar, me fico...

um abraço

R

Vítor Lindegaard disse...

Caro Filipe,

Defender que, por muito que deus provavelmente não exista, a religião "despeja sentido no real cada vez mais difícil de suportar" é a posição que, no actual debate sobre religião, se chama muitas vezes "crença na crença". Há até ateus que consideram a religião um traço fundamental de humanidade e também há quem defenda que, embora sendo um produto lateral da evolução, a possibilidade de crença religiosa trouxe vantagens à espécie, criando coesão social.

Ora o que é curioso é que há vários estudos que indicam, precisamente, que os ateus não vêem na vida menos sentido do que os religiosos, nem têm mais medo da morte do que os religiosos, nem são menos solidários do que os religiosos, etc. Tudo parece indicar, pelo contrário, que as sociedades onde há maior índice de satisfação e maior coesão social são as sociedades onde há maiores percentagens de não-crentes.

Pelos vistos, não faz falta religião nenhuma para dar sentido ao real...

Um abraço ateísta

Filipe Pereirinha disse...

Caro Vitor
Talvez as religiões não façam falta nenhuma, mas o que é certo é que elas proliferam, quer sob a forma tradicional, quer sob as vestes dessa "nebulosa místico-esotérica" do que convencionou chamar-se de "New Age" (Cf. LIPOVESTKY, G., Le Bonheur Paradoxal, Gallimard, p. 120). Se as religiões e o ateísmo - como dizes - se "religam" por meio do "sentido" que é dado ao real, então haveria, talvez, que re-introduzir o o "não-sentido" do real...
Um abraço

Vítor Lindegaard disse...

Caro Filipe,

Eu não acredito muito que as religiões proliferem. Estou convencido de que a percentagem de pessoas religiosas diminui constantemente. Fala-se muito desse "renascer da espiritualidade", mas nunca vi nem nada que o provasse (talvez Lipovetsky tenha provas que eu deconheço...). É um bocado como o aumento da criminalidade: toda a gente diz que há, mas, quando se vai ver, não há... Que haja agora no mundo rico algumas superstições novas não me prova nada, porque também há várias superstições "tradicionais" que se foram extinguindo. Nota, a propósito, que noutras partes do mundo não são as crenças new age que ganham terreno em relação às religiões mais antigas, mas sim os monoteísmos, sobretudo nas versões ditas "carismáticas". Mas, também nos países do terceiro mundo, estou eu convencido, a percentagem de crentes diminui constantemente. No último censo da população aqui em Moçambique, há, como eu dizia lá em cima no post, um quarto da população que se declara sem religião. É provável que o número seja inflaccionado, por culpa do inquérito ou dos recenseadores, mas o certo é que, muito provavelmente, não tinhas nesta terra, há 100 atrás, nem 1% da população que fosse sem religião. E o mesmo em todo o mundo. De uma situação em que não ter religião era extremamente raro (e perigoso), tem-se caminhado sempre em direcção a uma situação de cada vez maior a-religiosidade. Mesmo pessoas que se dizem hoje religiosas, e que até vão à igreja uma ou duas vezes por ano, não são de facto religiosas, porque não pautam de modo nenhum a sua vida pelas normas da religião que dizem ter.

Quanto à segunda parte do teu comentário, não a compreendo. Talvez possas explicar de uma maneira menos obscura...

Um abraço

Vítor

Igor Lobão disse...

Boas.

Gostei muito não só do seu artigo, como também dos seus blogs, e estou de acordo com algumas coisas do que está escrito por si neste post (se bem que nem sempre no mesmo sentido), contudo gostaria de explicitar alguns pontos em que discordo.

1 - Não me parece que Deus e a malária se coloquem no mesmo plano. Se Deus poderiamos situar do lado de uma "eficácia simbólica", para retomar uma expressão de Lévi-Strauss, a malária surge do lado do real. Enquanto que somente através da utilização da linguagem se pode fazer a coisa-malária ganhar uma visibilidade própria, arrancá-la à sua indeterminação, até do próprio ponto de vista da medicina, as várias metamorfoses do divino surgem como intrínsecas ao próprio acontecimento da linguagem (que remontam às primitivas religiões naturais). Por conseguinte, se por um lado, parece-me impossível erradicar o divino da existência humana e da linguagem (desconheço alguma prova nesse sentido), tal que está entretecido com a essência da linguagem, por outro lado, também é verdade que existem línguas que ao deixarem de ser faladas o saber que nela se sustenta desaparece com elas. Ou seja, nunca mais nomeadas, tornam-se erradicadas, desaparecem. Isto porque a sua ‘materialidade’ é diferente da malária. Com isto pretendo afirmar que é de facto com a linguagem que se chama à existência toda e qualquer possibilidade de um sentido, inclusive do inominável. No caso da malária, se a palavra malária fosse erradicada do nosso vocabulário e não fosse substituída por uma outra, de facto não se erradicava o vírus, mas a possibilidade de um sentido e de uma explicação, chamemos positiva, para ele. Surgiria, muito provavelmente, no domínio de um castigo divino, caso estivéssemos ainda no domínio da linguagem. Porque se estivéssemos desprovidos do registo simbólico e nos situássemos puramente no domínio do real, muito provavelmente só sentiríamos dor, sem saber o que nos atingiu. Parece-me, e de acordo com o que sua própria constatação, que a comparação é da ordem de um abuso. Para mim, na verdade, é um abuso que não conseguiu nenhum esclarecimento, o que torna curiosa a sua interpretação, no primeiro ponto sobre “O nome e a coisa”, do que o Filipe disse como retórica (penso que se situa no âmbito da problematização), não fosse tal forma argumentativa de proceder, essa sim, uma verdadeira estratégia de retórica, a de conduzir o que existe de problemático no discurso do Outro à importância de uma conversa de café.


Em relação à fundamentação de Deus no domínio do inominável, fundada numa não possibilidade de nomeação, uma coisa-deus, como disse, isso implica que existe já algo que se verte, que se realiza na linguagem (chame-se pura intuição ou outra coisa qualquer), algo que é chamado à existência através do que me parece ser uma nomeação que, para todo o efeito, recusa um nome. Lembremo-nos que também Deus se manifesta a Moisés na recusa de um nome: Eyer Asher Eyer (eu sou o que sou).

2 - Sobre o racionalismo - até que ponto, consagrar-se à racionalidade uma primazia (totalitária) não é fazer dela um mito? O mito da luz? Por exemplo, Hume dizia que a razão se fundava no hábito e na crença (curiosa a sua argumentação, ao ponto de fazer Kant despertar do seu sono dogmático). Freud, por seu turno, demonstrou que ela não é dona e senhora da sua casa (ou seja, da realidade psíquica). E, para finalizar, como Khun demonstrou, existe uma espécie de conservadorismo radical e cego que permanece no núcleo das comunidades científicas, essas tais comunidades que vivem no registo do verificável e do demonstrável, como hoje de resto poderemos verificar com a psiquiatrização e a psicologização massiva da sociedade (perceberão elas o “não-sentido do real” em que estão embrulhadas, ao não escutar o seu “ruidoso silêncio”? – talvez seja para uns mais importante os rendimentos que provenham da industria farmacêutica e para outros o rendimento que lhes proporciona um mundo em decadência espiritual, que se traduz para alguns poucos em consultórios cheios).
Parece-me que aqui Khun tem uma argumentação muito incisiva ao constatar demonstrativamente (verificar a “Estrutura das Revoluções Cientificas”) que os racionalistas podem autênticos velhos do Restelo (veja-se a atitude que ainda hoje permanece da medicina em relação às terapias alternativas), tão dogmáticos como um acérrimo crente religioso, bem como que o conhecimento científico de cumulativo pouco têm, mas processa-se por revoluções, por saltos de paradigma em paradigma, paradigmas que correspondem a estruturas simbólicas e que injectam sentido no real. Tal como as religiões. Essa cumulatividade seria tão somente uma ficção do nosso olhar contemporâneo (veja-se, por exemplo, as dificuldades que enfrentaram as ideias inovadoras de Freud ou Darwin nos seus círculos científicos, tal como podemos também verificar as discussões acérrimas sobre a teoria darwinista, que são explicitadas por Armand Marie Leroi, para se observar a dinâmica deste conservadorismo. Parece-me que bons exemplos contemporâneos não faltarão). Poderia dizer, utilizando uma expressão análoga à que utilizou para com o Filipe, que nunca vi nada que provasse essa de uma forma geral essa abertura do racionalismo científico, até porque, como o Vitor afirma, um cientista é como as outras pessoas, a saber, comporta as mesmas tendências que os outros para se refugiar na escuridão (como Platão ilustra logo de entrada na alegoria da caverna no movimento da luz para a escuridão), – e para dela sair, diga-se de passagem - e, nesse sentido, a ciência e a razão podem muito bem ser a toca onde se refugiam e nem sempre da melhor forma (não esquecer que os avanços científicos não são somente factor de rejúbilo; comportam, muitas vezes, no seu avesso uma elevada factura).
Para se ultrapassar os paradoxos da performatividade da ciência o apelar-se a um “cientismo de rosto humano” (o que nos faz recordar o socialismo de rosto humano de Alexander Dubcek), a um meio-dia da ciência como um futuro a ser conquistado metodologicamente e de forma austera, parece-me sim, não somente uma construção ideológica, mas da ordem de uma retórica moralista de tipo kantiano, que ignora que o pathos é intrínseco ao próprio núcleo da racionalidade.

Talvez aqui poderia tentar interpretar as palavras do Filipe sobre - "re-introduzir o o "não-sentido" do real". Este não-sentido do real é talvez o que falta hoje ao excesso sentido e de racionalismo, ao facto de que não é possível sustentar-se um "meio-dia", um totalitarismo da luz sem sombra na razão na razão humana.

Por fim, é fácil comprovar que as religiões proliferam. Nunca se viu tantas religiões e seitas (até talvez seja o nome apropriado, uma vez que o termo religião é usualmente utilizado para as "religiões do livro") como hoje... you name it (cientologia, adventistas, etc, etc, etc, inclusive seitas que conduzem a suicidios em massa, fenómeno que é relativamente contemporâneo na forma como ocorre, e que merecia a sua devida interpretação). Em relação ao número de crentes nessas religiões, isso já não sei e suponho que seja difícil conseguir comprovar uma ou outra tendência. No entanto, gostaria de acrescentar, é significativo referir a existência de países emergentes demograficamente com fortes componentes religiosas (encontro-me de momento no Brasil e apercebo-me muito facilmente de um fenómeno religioso muito forte, fenómeno religioso que me parece ser extensível a uma grande parte da Améria Latina. Gostaria de mencionar, de passagem, o recurso a Deus em alguns dos discursos de Obama... é significativo de algo, parece-me...).

Tirando estes pontos que discordo e que fazem parte de uma salutar discussão desejo-lhe uma boa continuação do seu trabalho nos seus blogs,

Igor

Vítor Lindegaard disse...

Caro Igor Lobão,

Quando escrevi no topo do blogue, à direita, que não tenho aqui em Chimoio ninguém com quem discutir certas questões e convidei os eventuais leitores do blogue a serem a metade em falta nas minhas conversas de fala-só, foi com toda a sinceridade que o fiz. Mas muito poucas pessoas responderam ao meu apelo. Agradeço-lhe, muito sinceramente, ter querido participar nesta discussão e contribuir para tornar este blogue o espaço de conversa que eu queria que ele fosse – mas que não sei se merece ser… Para continuar o debate, alinho aqui umas quantas reflexões suscitadas pelos seus comentários à minha reacção ao texto do Filipe Pereirinha no @topia:

1– Nomes, noções, referentes e retórica: Deus e a malária não se colocam no mesmo plano, como não se colocam no mesmo plano uma noção e a sua referência. Eu não quis ir mais longe na dissecação do processo retórico do Filipe segundo o qual quanto mais se diz que Deus não existe mais se prova que ele existe (pareceu-me suficiente dizer que o nome não é a coisa), mas é nessa amálgama que o processo assenta. A palavra cão representa uma noção, que é relativamente lateral definir aqui, mas que defino de forma simplificada como um feixe de propriedades. Ora a palavra cão não morde. Nem a noção que ela representa. O que morde são animais concretos no mundo extralinguístico e extraconceptual – e mordem independentemente de como tenhamos moldado individualmente a noção socialmente sancionada de cão que adquirimos, e quer acreditemos em cães ou não! Vejamos a palavra dinossauro. A palavra representa também uma noção, um feixe de propriedades, mas, ao contrário do que acontece com a palavra cão, as ocorrências individuais da noção no discurso não têm referente no mundo extralinguístico. Como a questão da existência do que já existiu mas já não existe é complexa, direi apenas que o facto de não existirem no mundo real referentes da noção representada pela palavra dinossauro significa que qualquer frase em que entre esta palavra e em que seja expressa uma relação directa com o aqui e agora de quando é dita essa mesma frase (“acabo de encontrar um dinossauro no caminho”, por exemplo) tem um valor de verdade nulo. Por outras palavras, menos diplomáticas, quiçá, é uma grande patranha – a pessoa não viu dinossauro nenhum!

Eu não digo que a noção de deus não existe. À partida, aliás, não há noções falsas nem verdadeiras. O que eu digo é que é uma noção cujas ocorrências no discurso com valor referencial têm um valor de verdade nulo. Uma ateísta pode dizer “Deus é uma questão central da reflexão filosófica europeia”, e deve entender-se aqui a palavra Deus como significando “a ideia de Deus”, “o conceito de Deus”. Muito bem. Mas quando uma crente diz “Deus quer que o adoremos e que respeitemos a Sua palavra” o valor da palavra Deus é referencial. Ela não quer dizer que “o conceito de Deus quer que adoremos o conceito de Deus”. O artifício retórico do Filipe é este. O facto de eu pronunciar a palavra dinossauro não faz aparecer répteis gigantescos na face do planeta. Da mesma forma, e ao contrário do que o Filipe afirmava, não é pronunciar a palavra Deus que faz existir um ser com as sobrenaturais características que quem nele crê lhe atribui – como ser real, não como noção!

Não sei o que Lévi-Strauss quer ao certo dizer com “eficácia simbólica”, mas é certo que a malária [a doença é causado por um parasita, não por um vírus, o que, não tendo importância nenhuma para o debate, é fundamental para a compreensão da doença que mais mata no mundo] surge perigosamente do lado do real. E deus não, para um ateísta. Para um ateísta, deus é como um troll: uma noção vazia de referentes. Para um crente, é o oposto que é verdade: Deus tem uma realidade tão real como a malária. Tão real que pode influenciar, como a malária, a vida das pessoas. Não tenho a certeza de compreender como devia a frase “várias metamorfoses do divino surgem como intrínsecas ao próprio acontecimento da linguagem” mas, se a compreendo bem, a quase totalidade dos crentes acha-a certamente blasfema.

2. Racionalidade e dogmatismo: Quando um racionalista é dogmático, não está a ser um verdadeiro racionalista, pelo menos no sentido em que eu o entendo, porque não se pode defender racionalmente o dogmatismo. O racionalismo como condição perene de alguém é obviamente um mito. Não há ninguém que seja capaz de constante racionalidade. Mas também não é aí que eu quero chegar, nem acredito que seja isso que algum racionalista propõe. As melhores maneiras de definir o racionalismo são, ao mesmo tempo mais modestas e mais realistas. Não quero ir mais longe do que Betrand Russel e sublinhar apenas «a importância da atitude de não acreditar em alguma coisa a não ser que haja alguma razão para pensar que essa coisa é verdade». Isto quer se trate da existência de fadas ou de o chá de limão fazer bem às constipações. Este racionalismo modesto que eu defendo não tem crenças fixas nem histórias imutáveis, a não ser que não vale a pena passar muito tempo a especular sobre algo que não seja defendido com o mínimo de bom-senso, um mínimo rigor e, sobretudo, de forma a ser inteligível para os outros, ou, se se preferir, passível de ser partilhado por todos os seres humanos (o que não significa, claro está, efectivamente partilhado por todos os seres humanos, longe disso). Toda a actividade humana, inclusive a actividade racional, tem de se fundar parcialmente no hábito e na crença, mas pode fundar-se mais ou menos sobre eles e pode fundar-se em hábitos e crenças de vários tipos (Russell, já agora, propõe o “hábito racional”, que, diz ele, é raro…). Diz o Igor que “Freud (…) demonstrou que [a razão] não é dona e senhora da sua casa (ou seja, da realidade psíquica)”. Estou perfeitamente de acordo consigo (embora conheça demonstrações mais concludentes desse facto simples do que as de Freud…). Mas que não seja a razão a comandar a psique é uma afirmação que não tem implicações na discussão da melhor maneira de conhecer o mundo e, sobretudo, de o explicar.

3. Ciência e racionalidade: Eu conheço a teoria dos paradigmas de Khun, mas acho que ele “demonstrou” apenas o cada um aceitar que ele demonstrou... No meu caso, tenho muitas dúvidas em relação às teorias khunianas e teria, seguramente algo a dizer relativamente a mudanças de paradigma versus evolução “cumulativa” da ciência, mas é outra discussão. O que quero dizer só de passagem é que é relativamente fácil a quem não trabalha com os problemas reais especular sobre questões que nem se colocam a quem trabalha com esses mesmos problemas. O melhor para ver o outro lado da questão é ler mesmo (e fazer) trabalho científico. Como diz e muito bem Steven Pinker, “método científico” é um conceito desconhecido dos cientistas, da mesma forma (isto já sou eu a falar) que “método criminológico” é, provavelmente, desconhecido dos investigadores criminais. O verificável e o demonstrável são condições básicas para a gente se poder entender, faça “ciência” ou não. (Ver, a propósito, o post que acabo de publicar, chamado “Ciência e bom senso: la vie en prose”, uma coisa singela que estava alinhavada há algum tempo e que, a reboque desta discussão, decidi reduzir e publicar.)

[Acrescento, já agora, entre parênteses, que não sei a que discussão do darwinismo por Armand Marie Leroi se refere, mas não tenho dúvidas nenhumas de que ele seja um darwinista convicto, no sentido mais tradicional do termo. Evidentemente, tem, como muitos darwinistas, hipóteses evolutivas (por exemplo, a sua hipótese de beneficial acclimation, que é, infelizmente, demasiado técnica para eu poder compreender a sua discussão) que estão longe de ser aceites pelos seus pares, mas não é porque sejam menos ou mais convencionalmente darwinistas do que a opinião defendida pelos seus detractores. Só que a ciência é mesmo assim: democrática. O que conheço de Armand Leroi, que não só tem pouco a ver com seja lá o que for de khuniano como o revela um darwinista perfeitamente convencional, tem a ver com a discussão do estudo das raças humanas (Veja THE NATURE OF NORMAL HUMAN VARIETY [3.15.05] na edge.org (por alguma razão, não consigo deixar aqui o link...). É claro que uma pessoa como eu tinha de ser grande fã das discussões do Reality Club, de que Armand Leroi faz parte, aliás.)

4. Conhecimento e técnica: Parece-me importante fazer uma distinção clara entre ciência e tecnologia, ou seja, entre conhecimento e técnica. Em sentido estrito, a medicina não é uma ciência, mas uma tecnologia baseada em conhecimentos que lhe vêm de áreas de saber várias, principalmente no âmbito da biologia. Tal como entendo a sua expressão “cientismo de rosto humano” (e, se a entendo bem, concordo perfeitamente com ela enquanto princípio moral), ela diz de facto mais respeito à tecnologia, então, do que à ciência como tal. E concordo plenamente que há uma parte da tecnologia, médica e não só, que pode ter efeitos devastadores. Sempre assim foi, desde a fabricação das primeiras rodas, que podem ser usadas tanto para o bem como para o mal. Nada de novo, aqui, debaixo dos céus. É de salientar, porém, que algumas das maiores contribuições para o bem-estar da humanidade são conhecimento transformado em tecnologia de curar – a penicilina é, provavelmente, o melhor exemplo…

5. O sentido do real: Continuo a não ter a certeza de perceber o que significa o “não-sentido do real”. Tal como eu vejo as coisas, o real não pode deixar de fazer sentido, porque o assumir de uma ausência de sentido poria em causa a sobrevivência dos indivíduos. É por isso que eu gostava que isto fosse explicado mais em pormenor, se possível com exemplos.

As possibilidades que eu vejo de interpretar a asserção de que o real não tem sentido são basicamente as seguintes:

i) “O real não tem sentido por si, não tem sentido imanente. São as leituras que dele se fazem que lhe dão sentido”.
É tão fundamentalmente verdade que é uma asserção desinteressante quando se quer saber alguma coisa sobre seja lá o que for. Além disso, embora fundamentalmente verdadeira, a asserção precisa de ser matizada: as características imanentes do real agem, em parte, na leitura que dele fazem – no sentido que lhe dão – os seres vivos. As cores que eu vejo numa paisagem são determinadas pelos mecanismos que possuo de processamento da informação visual. Fosse eu um lagarto, veria outra paisagem. Muito bem. Mas a maneira como eu processo essa informação não é independente (e é quando se esquece isto que se entra com facilidade no exagero solipsista) das propriedades físicas concretas da matéria que eu estou a observar.

ii) “O real não tem um sentido último, transcendente, existencialmente satisfatório. A existência, em última análise, é sem sentido.”
Esta ausência de sentido pode ser sentida como algo negativo ou encarada como “a mais alta e perfeita iluminação” (que é como eu presumo que o Filipe, se é isto que ele quer dizer…, propõe que o não-sentido se encare…). Quando é sentida como uma falta, é esse vazio negativo que muitas religiões – em sentido lato, nem que seja o endeusamento da racionalidade que refere – querem preencher. O que eu acho é que, independentemente da valorização positiva ou negativa que se faça de uma ausência de sentido assim, ela tem pouco a ver com a vida da maioria das pessoas deste mundo.
Eu sei que, quando tenho fome, preciso de comer e que, se me lançar do alto de uma falésia, o meu corpo vai chegar lá abaixo desfeito. Posso prever a dor a morte. Não só o real tem um sentido – muito concreto, até – como uma grande parte do sentido que ele tem já vem em mim à nascença e não é alterável. É verdade que, se quisermos ir muito mais longe do que isto, não vamos muito longe – a transcendência é um beco sem saída... Mas eu não preciso de ir mais longe. Este sentido chega-me bem. A mim e a muita gente. Se calhar, à maior parte das pessoas do mundo. Quando aumentaram o preço dos chapas em Maputo, uma grande parte da população viu no real que tinha à frente um mesmo sentido: «Se, em vez de pagar mensalmente em transportes um oitavo do meu salário, passo a pagar um quarto do salário, estou desgraçada!». O sentido do real era tão óbvio que as pessoas dispuseram-se ao conflito e foram mortas seis a tiro pela polícia, antes de serem satisfeitas as suas reivindicações de não aumento de preços. Nem por um momento lhes passou pela cabeça que, bem vistas as coisas e a sua inerente complexidade, e a parda e constante iminência da morte e da impossibilidade de certezas, etc., etc., tudo aquilo fosse, como o resto das coisas da vida, sem sentido nenhum. Se vir as coisas desta maneira, a consciência de uma possível vacuidade de sentido do real e a reflexão sobre ela é, de certa maneira, um luxo… Mas, insisto, pode ser que tudo o que acabo de escrever seja irrelevante, porque, se calhar, não é nada do que eu compreendi que o Filipe e o Igor querem dizer com “não-sentido do real”…

6. Sobre a proliferação das religiões: É verdade que eu respondo com pouco rigor, misturando proliferação de religiões e proliferação de crentes. Reconheço o erro e peço desculpa por não ter sido um pouco mais reflectido antes de publicar o meu comentário. Mas continuo convencido de que não há evidência de que haja proliferação nem de religiões nem de religiosos (mas claro, a discussão é um bocado vaga, porque não definimos a unidade religião para se saber como e quantas se contam, nem a partir de quando e em relação a que “linha de base” se deve considerar a proliferação, nem foi apresentado no debate nenhum estudo minimamente credível sobre o assunto…). O que eu disse é que, em muitos lugares são as versões ditas “carismáticas” (IURD e afins) dos monoteísmos que se desenvolvem. Isto não implica o nascimento de novas religiões. Por exemplo, a religião em maior crescimento na África Austral é o cristianismo, devido sobretudo à expansão da Igreja Zionista [atenção, não tem nada a ver com a sionismo, mas com o facto de a igreja ter sido criada em Zion, Illinois] da África do Sul (18% dos moçambicanos dizem-se zionistas no último censo). Mas não é uma religião nova, é apenas uma variação do cristianismo. O adventismo não tem nada de novo, foi criado em 1833 e foi já uma doutrina protestante mais poderosa do que é hoje. Por outro lado, parece haver denominações protestantes (metodistas, igreja reformada, etc.) em franca decadência, o que parece confirmar que há umas que vão, outras que vêem. Não há nada de novo nisto. Muitas variantes do cristianismo que existiram na Europa e no Norte de África extinguiram-se a determinada altura e outras novas variantes foram formadas. Mesmo propostas religiosas muito poderosas no chamado mundo ocidental ainda há relativamente pouco tempo (a teosofia é um bom exemplo, mas há mais) perderam a sua importância ou desapareceram. Da mesma maneira, se seitas como as de Ron Hubbard, que mudou de nome algumas vezes mas é sempre a mesma, são efectivamente novas, também há muitas “novas” religiões que são de facto variações – muito pouco originais, a maior parte delas – de religiões ou filosofias orientais clássicas, feitas por determinados gurus mais ou menos “messianizados” (Maharishi Mahesh Yogi, Guru Maharaji, Meher Baba, etc.), e mesmo que algumas delas pareçam originais (Bhagwan Shree Rajneesh/Osho, por exemplo, com a sua famosa doutrina “laranja” de libertação sexual), não têm nunca muitas novidades. É claro que o Brasil é o país new age por excelência e mesmo o guia Lonely Planet avisa logo os visitantes de que há muitos mais discos voadores na região à volta de Brasília do que em qualquer outra parte do mundo. Mas vivi na Bolívia, que é mesmo ali ao lado, e o panorama religioso é completamente diferente. Pelo que continuo com muitas dúvidas sobre a proliferação das religiões. [Também não são só as novas seitas que são suicidas. Os bogomilos, uma variante radical dos cátaros com algum sucesso na Europa medieval, eram, na prática, suicidas e de uma forma mais radical, porque era o suicídio da espécie que propunham. Uma coisa engraçada das religiões é que cada qual é mais fascinante – e mais delirante… – do que a outra...]

Caro Igor, acho que fico agora por aqui. É realmente um prazer discutir consigo estas questões e espero sinceramente ter sabido ser comedido na expressão. Já muitas vezes me apontaram o defeito do excesso de veemência… Não é característica que me agrade e faço tudo o que a minha consciência me permite para não cair nesse erro, sinceramente, mas, como o Igor e eu bem sabemos, não é sempre a nossa racionalidade a mandar no que somos.

Muitos cumprimentos

Vítor

Igor Lobão disse...

Agradeço a sua extensa e rica resposta à qual passo a responder (agora que a acabei, a constato um pouco extensa):

Não se pode responder ao que é o Real e o que é o não-sentido do Real no modo de uma definição. Não é uma visibilidade que possa ser esculpida directamente, tal como se verifica, por exemplo, com a problemática inerente ao percurso histórico ocidental da definição conceitual do que é o homem, desde Platão e Aristóteles, passando por Boécio, St Tomás de Aquino e Hegel, até Foucault ou Lacan, por exemplo. Como entender essa dificuldade da captura num conceito? Parece que poderíamos para já situar o real, e de uma forma bastante simples, como o que vai resistindo ao seu fechamento numa nomeação, como se existisse um excesso inominável.

Não consigo perceber quando afirma que o real tem um sentido, uma vez que o sentido que existe é inerente ao ser humano e não ao real e encontra a sua razão de ser nas estruturas simbólicas que lhe preexistem e através das quais o sujeito se realiza como ser de perspectiva e como falante. Portanto, quando afirma que Deus tem uma realidade tão real como a malária, tem toda a razão, o que corresponde à injecção de sentido no real a partir de uma estrutura simbólica que comporta em si mesma a inscrição do nome de Deus. É essa realidade de Deus que poderíamos colocar do lado da «eficácia simbólica».

Quando o Vítor fala que “O sentido do real era tão óbvio que as pessoas dispuseram-se ao conflito e foram mortas seis a tiro pela polícia, antes de serem satisfeitas as suas reivindicações de não aumento de preços”, a expressão sentido do real é extremamente equivoca, na medida em que o sentido só pode ancorar na estrutura simbólica que determina as acções no real (por exemplo, não passar um sinal vermelho). O real não tem qualquer sentido que possa ser transcrito numa linguagem, mas é o sujeito que confere sentido àquilo que experimenta no real, o que é um ponto de partida diferente. Volto a insistir: Só sabemos o que é a malária e a podemos tentar tratar porque ela para além da existência real também existe na linguagem, vive na linguagem. Aliás é somente dessa forma que a conheço (agora já não como um vírus, mas como um parasita)... Caso contrário, se estivéssemos meramente no registo do real, desprovidos do simbólico, morreríamos sem saber o que nos atingiu, sem configurar um sentido para o real, porque ele não fala por si mesmo, mas somos nós que lhe conferimos um sentido ao fazer a sua experiência através da mediação do simbólico. Existem, por isso, regimes de sentido a partir da experiência do real, estruturas simbólicas que organizam a experiência do real para um sujeito e que o inscrevem num sentido através de uma circulariedade permanente entre a experiência do real e uma estrutura simbólica.

Não é tão simples dizer que “O real não tem sentido por si, não tem sentido imanente. São as leituras que dele se fazem que lhe dão sentido”. Essas leituras são leituras que estão inscritas na "carne", são os trilhos em que um sujeito já dá por si desde sempre já lançado no seu caminho. E o ser humano jamais conseguirá sair desse regime de sentido. A ciência é, igualmente, uma estrutura simbólica que confere uma leitura sobre o real e uma leitura que é revisível. Aliás, é nesses sentido que Popper propôs a falsificabilidade. Direi mais. A ciência em si mesma é uma ficção, parte de construções (teóricas) que podem ou não funcionar. Podemos explicitar o carácter de ficção através dos números negativos ou dos números imaginários. Eles não existem no real, mas são necessários para tentar-se produzir uma interpretação ou uma inervenção no real. O pressuposto de Galileu, de que o real pode ser transcrito em linguagem matemática, ou de Max Plank, de que real é o que se pode medir, são apenas pressupostos de ordem metafisica e que por sinal radicam numa estrutura simbólica.

Tal como não corresponde ao facto de que “O real não tem um sentido último, transcendente, existencialmente satisfatório”, porque poderemos muito bem conceber que existe um sentido transcendente para o real, que é o do não-sentido. E acrescentaria que tal tem uma importância decisiva, fulcral na vida das pessoas (pois está enredado no sentido da vida), para além do regime da vida que Heidegger designou de Zuhandenheit, pelo qual ocorre o reconhecimento do quid, da identidade das várias “coisas” com que lidamos na nossa quotidianeidade e na nossa vida prática.

O “não sentido do real”, apesar de se poder encontrar alguns pontos de contacto com o real da ciência, não poderemos dizer que coincida na totalidade com ele. É uma construção de Lacan para fazer referência ao curto-circuito que, por exemplo, a irrupção do sintoma, como manifestação do real, nomeadamente do real pulsional, provoca no funcionamento da racionalidade. Aliás, a singularidade do sintoma encontra a sua lógica na própria dinâmica da racionalidade de um sujeito, é-lhe profundamente inerente, radica na sua estrutura, é o corpo estranho do qual o sujeito nada sabe: é o seu avesso. É essa a principal marca do sintoma, a de um não-saber, um não saber que contudo é um saber que não se sabe que se sabe. Apesar de algumas aparentes semelhanças com o númeno kantiano, distingue-se dele, por exemplo, no facto de que esse não-saber repousa num movimento de retorno, tal como um boomerang. Simplesmente, enquanto o boomerang normalmente o apanhamos com as mãos, para o que é da ordem do sintomático não existem mãos a medir (talvez seja por isso que tanto os médicos como as próprias pessoas prefiram se "enfrascarem" e se anestesiarem com fármacos) Julgo que não valerá a pena deter-me muito tempo neste tema complexo. Se o Vítor pretender aprofundar os seus conhecimentos nesta formulação lacaniana do real existem toda uma literatura que poderá consultar e, se pretender, criticar aqui no seu blog. É uma sugestão que lhe deixo.

Em relação à minha frase - “várias metamorfoses do divino surgem como intrínsecas ao próprio acontecimento da linguagem” -, nada tem a ver com a existência de crentes ou não, mas com o facto do da divindade ser irredutível na linguagem, na condição de termos em consideração a linguagem como o que permite a relação, o laço social. É algo que não tem qualquer leitura individual, mas colectiva. O contexto onde a utilizei tem a ver com a impossibilidade de apagamento das nomeações da divindade da linguagem. É, se assim se pode dizer, algo da ordem da transcendência que é convocado com a linguagem, algo que corresponde ao fenómeno de desencontro do ser humano consigo mesmo ao ser literalmente atravessado pela palavra, palavra esta que não remete somente para o referente: serve para fazer poesia, para gozar (existe quem, inclusive, goste de dizer obscenidades durante o acto sexual). O fenómeno da divindade surge de forma concomitante com o aparecimento da linguagem e, muito provavelmente só morrerá com a sua morte. Compreendo bem, por isso, quando diz que a maior parte dos crentes a acharia blasfema. Subscrevo tal.

As metamorfoses da divindade, no sentido que visei, tem a ver com a dialéctica histórica, tal como apresentada por Hegel, que se refere à forma como Deus se manifesta, por um lado, e na forma como é conhecido, por outro. Segundo Hegel, a metamorfose ocorre precisamente na forma como Deus, como a divindade por excelência, é conhecido. A interpretação que eu confiro a essa formulação de Hegel, é a de que essas metamorfoses dos nomes das divindades correspondem à forma como se procura “cozer”, colmatar esse des-encontro desconfortável e profundamente inerente à vivência de si mesmo do ser humano. O que não quer dizer que seja a única forma de se fazer algo a partir desse des-encontro. Existem várias saídas para esse des-encontro e uma delas é a experiência estética, que juntamente com a religião se encontram entretecidas com o surgimento do ser humano como falante.

Quanto ao que é um verdadeiro racionalista, nunca vi nenhum. Não sei bem a que é corresponde essa expressão no real. Penso que como candidatos a serem um verdadeiro racionalista poderiamos talvez pensar no Deus de Leibniz ou então no Deep Blue, o computador que venceu Kasparov em 1997.

Bom, o ser humano é definido tanto por Aristóteles como animal racional, como por Boécio por substância individual de natureza racional. Será, por isso, o verdadeiro racionalista o «super-homem»? Ou será Einstein mais racionalista que a Madre Teresa de Calcutá? Talvez sejam racionalismos de ordens diferentes… e com consequências diferentes. Ainda bem que ambos existiram esse dois animais racionais.

Quando afirma que conhece demonstrações mais concludentes desse facto – penso que seja ao inconsciente que se esteja a referir - simples do que as de Freud, devo dizer que eu desconheço. Inclusive as interpretações filosóficas de Freud de autores com o peso de Ricoeur ou Deleuze esbarram em mal-entendidos no que se refere aos fundamentos do inconsciente e que distorçem o sentido pretendido. Tal como o inconsciente em Freud não é da ordem de um inconsciente romântico. É um inconsciente que se funda numa lógica. Contudo, porque o saber não ocupa lugar, estou aberto a rever as minhas posições, se me indicar as referências bibliográficas onde eu possa consultar essas “demonstrações mais concludentes”.

Vou ficar por aqui. Deixe-me acrescentar que achei este pequeno confronto de ideias muito interessante e, pelo menos para mim, enriquecedor.

Cumprimentos,

Igor

Vítor Lindegaard disse...

Caro Igor Lobão,

Peço desculpa pelo atraso na resposta, mas fui de fim-de-semana para a praia, com a família. Ainda tive tempo de ler o seu comentário antes do fim-de-semana, mas só agora é que lhe posso responder.

Constato que a nossa conversa tem tendência a espraiar-se. Para evitar que se torne uma conversa sobre tudo (para um racionalista como eu, o princípio de focalização é importante), vou passar a discussão sobre a ciência, que é uma discussão que me interessa, para uma continuação do post Ciência e bom senso: la vie en prose que ainda não sei quando publicarei... Limitar-me-ei aqui a responder às questões relacionadas com a polémica inicial com o Filipe Pereirinha, a saber: 1) Crença em deus e modalidades dessa crença; 2) o sentido do real (o mais que havia desapareceu, pelos vistos, do debate). Farei também um breve comentário sobre a questão do racionalismo e, por fim, respondo-lhe a duas perguntas concretas, relacionadas com Lacan e Freud.

Em relação ao ponto 1) sobre as modalidades da crença em Deus, quero explicar mais uma vez (é uma coisa que os ateístas passam a vida a explicar…) que o deus de que nós, ateístas, duvidamos é o deus em que crêem os crentes das diversas religiões, a saber: um ser real (não um lugar numa estrutura simbólica, não uma metáfora do equilíbrio universal ou das leis da física, não um conceito seja de que tipo for, mas um ser real) que criou o universo ou tem sobre ele poderes não atribuíveis a outras criaturas do mundo físico, tem interesse imediato na vida da pessoas e interage com elas de diversas formas. De resto, não nos encontramos em desacordo com quem considere deus seja lá o que for no plano simbólico…

Em relação a este tema ainda, quero explicar mais uma vez que, do ponto de vista estritamente linguístico, a palavra deus não é essencialmente diferente da palavra pé, mãe ou chuva, no sentido em que nenhuma delas desaparecerá nunca provavelmente da linguagem (isto a propósito de o nome de deus não poder nunca desaparecer…), nem é essencialmente diferente dessas mesmas palavras enquanto remetendo para um noção. Para um teísta, ela também não é essencialmente diferente de pé, mãe ou chuva no sentido em que pode ser usada referencialmente (para simplificar a discussão, deixo de lado a questão de ser um nome próprio, no caso de o teísta ser um monoteísta). Para um ateísta, deus é, como duende, uma expressão que não refere uma entidade do mundo extralinguístico.

O Igor tem andado um bocado à volta da questão, querendo fazer da palavra deus talvez algum tipo especial de palavra, mas ela é exactamente como muitas outras. Que as palavras não sirvam só para referir, é certo, mas isso aplica-se a todas as palavras e é sem interesse para a discussão da referencialidade de deus versus o seu uso como designando um conceito mas não uma entidade real.

O Igor afirma que “o fenómeno da divindade surge de forma concomitante com o aparecimento da linguagem e, muito provavelmente só morrerá com a sua morte”. É possível; mas não só as manifestações religiosas – também a música e uma série de outras capacidades humanas. Isso deve-se simplesmente ao facto de que são fenómenos que só podem surgir em sistemas nervosos complexos – ou sejam, aparecem quando a evolução do cérebro os deixa surgir. Mas é bom reconhecer que é uma matéria em que há muito poucas certezas e a datação do aparecimento destes fenómenos não é sem problemas. Postula-se que Homos não sapiens (Neanderthal, por exemplo) tinham crenças religiosas embora não tivessem linguagem complexa (há quem fale de proto-linguagem, mas, insisto, estamos em áreas em que há poucas certezas…)….

Quanto à questão 2) do sentido do real, acho que o Igor acaba por dizer o mesmo que eu digo, quando diz que «o sentido que existe é inerente ao ser humano e não ao real e encontra a sua razão de ser nas estruturas simbólicas que lhe preexistem e através das quais o sujeito se realiza como ser de perspectiva e como falante». Se exceptuarmos a identificação implícita entre conceptualização e linguagem (que é uma ideia estruturalista com muita fortuna, mas que eu acho que há muito boas razões para pôr em causa – aliás, já discuti aqui a questão na Travessa do Fala-Só http://llindegaard.blogspot.com/2008/03/lngua-elemento-de-identidade-mas-nem.html , se bem que muito ao de leve), o Igor diz o mesmo que eu quando digo que «são as leituras que dele se fazem que dão sentido ao real» e que «uma grande parte do sentido que ele tem já vem em mim à nascença e não é alterável». É exactamente o mesmo que o Igor diz ao afirmar que «é o sujeito que confere sentido àquilo que experimenta no real» e que «essas leituras são leituras que estão inscritas na “carne”» e que «o ser humano jamais conseguirá sair desse regime de sentido». Eu também acho. Só podemos dar sentido ao mundo através dos mecanismos cognitivo-sensoriais e simbólicos de que dispomos. Mas esta questão é sem interesse. Ou seja, o sentido do real para um humano é o sentido que o cérebro humano lhe dá, forçosamente. E depois? Como eu não tenho possibilidade nenhuma nem de perceber nem de conceptualizar o real a não ser através dos meus mecanismos humanos que partilho como todos os outros seres da espécie (salvo, naturalmente, em caso de deficiência, lesão, etc.) a questão é desinteressante. A não ser que se acredite, como alguns budistas, que é possível “parar o diálogo interno” e “a armadilha da mente” e “fundir-se com as coisas como elas são”. Como eu não sou dado a grandes delírios metafísicos, aceito-me como humano apenas e apenas igual, na minha percepção e conceptualização do mundo, aos outros humanos… Parece-me a mim uma questão, como se diz, sem muitas espinhas.

Sobre o racionalismo: Racionais, somos todos. E ninguém o é. Todos o somos o suficiente para olharmos para a esquerda e para a direita antes de atravessarmos a rua; para irmos, com mais ou menos dificuldade, obedecendo aos códigos de leis que nos regem; para sabermos que um ser material não se esvai no ar, de um momento para o outro; para termos consciência do perigo, quando ele surge; para fazermos previsões sobre as propriedades de objectos; etc.; mas também gostamos de papaias ou de abacates sem sonhar por quê; e apaixonamo-nos por esta ou por aquela pessoa sem que a racionalidade nisso intervenha para nada; e provavelmente gostamos de Freud ou de John Stuart Mill não apenas pelas razões que queremos – e cremos – ter para gostar deles; aliás, o mais das vezes, as razões pelas quais acreditamos ter tomado uma decisão não são senão uma justificação criada por nós… Racionais, somos todos. E ninguém o é. Somos todos perfeitamente racionais – ai de nós, se não formos… – e perfeitamente guiados por mecanismos que não só não controlamos como desconhecemos. Mas, como eu disse na minha última resposta, a consciência destes factos simples é sem pertinência na discussão de como se pode conhecer e explicar o mundo de uma forma mais eficaz.

Agradeço muito a oferta de aprofundar os meus conhecimentos de Lacan, mas Lacan não é, decididamente, para mim. Tinha dois volumes dos Escritos e tentei lê-los várias vezes. Mas sempre em vão. Eu não compreendo absolutamente nada do que ele diz. Ainda no outro dia, estive a ver os filmes no blogue do Filipe, e não percebo absolutamente nada do discurso lacaniano. Não é por não falar francês, eu falo francês quase tão bem como falo português, é porque o que ele diz para mim não é francês, é chinês, sinceramente… Não fosse eu acreditar na honestidade de quem diz compreendê-lo – e compreende, seguramente –, seria tentado a considerar que ele de facto não diz coisa com coisa…

Quando falo de demonstrações mais concludentes do facto de as nossas acções serem determinadas por razões que escapam à nossa consciência, falo (e que outra coisa se poderia esperar de um racionalista empedernido como eu?) de evidência observável, de cuja falta, como o Igor decerto saberá, é muitas vezes acusada a teoria freudiana… Como eu não sou da área da psicologia experimental nem das neurociências (sou de outra parte da psicologia chamada linguística, que se dedica a estudar uma capacidade apenas dos seres humanos, a linguagem) é-me difícil lembrar-me do que vou lendo aqui e ali e que não guardo, mas posso, ainda assim, referir os trabalhos clássicos de Benjamin Libet, baseados nas descobertas de Lüder Deecke. É muito interessante e levanta nomeadamente grandes interrogações relativamente à pertinência do conceito de livre-arbítrio.

Muitos cumprimentos de uma Chimoio cheia de chuva,

Vítor