13/03/10

Amor e contas à vida

Dizia não sei quem* que há coisas muito mais importantes do que o dinheiro, mas que o dinheiro serve, precisamente, para comprar essas coisas. É uma grande verdade e, a quem me disser que o dinheiro pode, talvez, ajudar à saúde mas não compra o amor**, eu digo que até o amor (amor a sério, precisamente esse sentimento em que vocês estão a pensar!), o dinheiro ajuda muito a conseguir. Ou melhor, em vez de o dizer eu próprio, cito um artigo de Jennifer Randles, que, com a ajuda de Eva Illouz, o diz melhor do que eu:
Como Illouz defende na sua convincente teoria da relação entre amor e desigualdade no capitalismo avançado, a ideologia dominante de casamento e idílio amoroso é que “não só o amor é cego ao estatuto social e à riqueza, como também transforma, em última instância, a pobreza em abundância, a fome em saciedade, a escassez em excedente”. Faz parte desta ideologia dominante o tropo o dinheiro não compra o amor. Embora isso, até certo ponto, seja verdade, é com certeza preciso dinheiro para comprar as coisas que criam condições para a prática do amor romântico (…).
O facto é que Romeu e Julieta, Tristão e Isolda, Abelardo e Heloísa e os outros casais de protagonistas das histórias maiores de romântica paixão são sempre gente economicamente folgada, digamos assim…

A matemática também é um bocado como o dinheiro: há muito conhecimento mais interessante e mais importante para a nossa vida que o da matemática em si, mas é quase sempre preciso matemática para obter esse conhecimento (por muito que tanto a matemática como afirmações como esta que acabo de fazer façam barafustar muita gente, e por várias razões…). E juntar o dinheiro e a matemática também é muito interessante, mas eu, que nunca estudei nenhum tipo de ciência económica e, no geral, não sei muito nem de dinheiro nem de matemática, só consigo fazer contas simples. Mesmo assim, sei que não se pode abusar de contas de tipo nenhum, mesmo simples, senão uma pessoas fica confusa. Por exemplo: Ao preço a que estão as verduras e a carne, quem é que lhes chega? Ali no Mercado 25 de Junho, a cenoura, a cebola e o tomate estão mais caros do que na Dinamarca, onde o salário mínimo é 40 vezes mais alto que o salário mínimo moçambicano. Um dia de salário não chega agora para comprar dois quilos de tomate, nem um frango de aviário, e o milho está a 5 meticais o quilo. Apetece dizer, para não fugir ao tema inicial, que não há, actualmente, muitas condições para o idílio amoroso…
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* Por mais voltas que dê a Google, não consigo mesmo descobrir o autor do aforismo... Às vezes é referido Bernard Shaw, às vezes Groucho Marx, mas nunca de forma convincente…

** Estou a pensar, como já devem ter adivinhado, naquela canção tão famosa como foleirita da autoria do grande tanguista argentino (aqui a palavra num dos seus sentido originais, o de compositor de tangos) Rodolfo Sciammarella que diz que na vida há três coisas pelas quais tem de se dar graças a Deus: saúde, dinheiro e amor. A versão original da canção é de outro grande tanguista argentino (aqui a palavra noutro dos seus sentidos originais, o de cantor de tangos), o grande Charlo, mas como não quero deixar-vos um tangueiro a cantar uma valsa, deixo-vos outra de se l’e tirar o sombrero, a do mexicano Juan Arvizu, que era mais bolerista que tanguista. Aproveitem, enquanto o link não se autodestrói, como as instruções da Missão impossível. E, quando quiserem soirées animadas, convençam a vossa companhia a discutir se é mais importante a saúde, o dinheiro ou o amor. A sério, já experimentei muitas vezes, e é de cada vez mais divertido que das outras vezes todas.

1 comentário:

Nuno (@gmail) disse...

Uma outra história de romântica paixão é a do protagonista do Germinal, do Zola, com a infeliz Catherine. Proletários e pobres, a história só podia acabar mal.