06/10/19

Ditos que o vento levou: «morreu um escrivão»


Perguntaram-me há dias que expressão havia em português para designar uma grande ventania—uma coisa que estivesse para o vento como «chover a cântaros» está para a chuva… Respondi sem hesitar que era «morreu um escrivão», mas depois fiquei na dúvida: seria mesmo uma expressão portuguesa ou só do idioleto da minha avó?


Pus “morreu um escrivão”, sequência exata, fechada com aspas, no motor de busca que costumo usar. Além de umas quantas, poucas, referências a variantes da expressão, encontro o seguinte em “Páginas folclóricas” (1925?), um texto de Luiz Chaves para a Revista Lusitana, dirigida por Leite de Vasconcelos:
 O vento rijo incomoda, é áspero. Atribui-se-lhe com ironia uma causa pejorativa: em Alcanena diz-se que «morreu um juiz em Torres»; em Bragança, «morreu um judeu»; «morreu um escrivão em Santarém», diz-se pela Estremadura central; «morreu um escrivão», diz-se em Lisboa. 
Já vários amigos, lisboetas como eu e mais ou menos da minha geração, me disseram que nunca ouviram tal coisa. É com toda a certeza expressão caída em desuso—de que sou eu, provavelmente, um dos últimos depositários…






Ilustração: Adrien Manglard, Côte et mer par coup de vent, 17??, Musée des Beaux-Arts de Lyon 
(Wikimedia Commons, daqui)

7 comentários:

jj.amarante disse...

Não conhecia essa expressão, apenas "grande ventania" ou então um "vento" seguido dum palavrão de uso generico com função de superlativo.

Bona Dea disse...

Não é o último depósitario. Desde pequena que me lembro da minha mãe dizer isso. E eu do alto dos meus 40 mantenho a tradição.

MDulce Dias disse...

A minha mãe sempre disse "morreu um es crivão" quando estava uma grande ventania. Somos da Beira alta. Nunca soube qual era a ligação.

V. M. Lucas Lindegaard disse...

Obrigado, Bona Dea e MDulce Dias. Ainda bem que há mais quem ainda use a expressão.

Anónimo disse...

A minha avó era da Beira Baixa e usava “morreu um judeu” mas nunca me soube explicar de onde vinha esta expressão

Anónimo disse...

Os meus pais eram ambos de lisboetas, sempre lhes ouvi dizer esta expressão, em dias de muito vento. Hoje ainda, a propósito da grande ventania, a utilizei. Pois, o meu Amigo também nunca a ouvira.
Sabedoria popular que, vai passando de boca em boca!
Bem hajam, aos que a utilizam, para que não se perca esta, e outras expressões culturais, tão nossas!

Anónimo disse...

Conheço perfeitamente essa expressão. Ainda hoje a usei por causa desta ventania brutal. Acho que era a minha tia bisavó que a usava. Pensei também que era uma expressão só da minha família. Fiz agora uma pesquisa na NET e vi que não é 😉