10/05/10

As palavras e as coisas pensadas

Da inter-relação profunda entre pensamento e linguagem, ninguém duvida, mas nem todos estão de acordo – longe disso – sobre como se organiza essa inter-relação: Qual das duas capacidades surge primeiro? Existe uma relação de determinação entre uma e outra?

Acho que observar de perto o crescimento de uma criança mostra claramente que não é verdade que o pensamento surge à medida que surge a linguagem, porque é determinado por ela, ou seja, porque é preciso língua para se pensar. Quero só contar a observação da minha filha de cinco anos, um dia destes ao jantar, a propósito de uma dificuldade que acabava de ter em dizer o que queria:

“Muitas vezes, eu penso numa coisa, mas depois não sei as palavras para dizer o que penso.”

Estará a Siri a ser vítima de um engano ou, como eu penso, a dar conta de um facto simples?

2 comentários:

  1. Eu concluiria o contrário a partir deste episódio. Que há consciência, talvez um tanto nebulosa, do que se pensa, mas ainda faltam as palavras... para concretizar melgor.

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  2. Obrigado pelo comentário, Ana!

    É uma discussão difícil, por falta de observáveis. E provavelmente também por falta de acordo sobre o que é ao certo pensar. Se tu dizes que há consciência, por muito nebulosa que seja, «do que se pensa», então há forçosamente pensamento antes de se o saber dizer. Agora, o que queres dizer com «concretizar melhor»? Que só quando se torna suficientemente organizado para ser facilmente transmissível é que o pensamento é pensamento? Que há outro tipo de atividade mental anterior à atividade cognitiva? Bom, para mim, a essência do pensamento não é ser concreto. Pode ser, mas também pode não o ser.

    Curiosamente, ainda antes de ter recordado este texto por causa da séria de posts que estou a fazer no Facebook, comecei a escrever um texto sobre este tema, com base numa experiência muito concreta que tive no outro dia, quando tive de refletir sobre ostomia sem ter palavras para o fazer em língua nenhuma. Quando o texto estiver pronto e publicado, eu mando-to.

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