12/12/17

Obrigado pela dança [Crónicas de Svendborg #27]


Imagem: Pixabay. CC0 Creative Commons
Na Dinamarca, é costume agradecer certas coisas que em Portugal não temos por hábito agradecer. Por exemplo, quando se acaba de comer, diz-se sempre «obrigado pela comida» a quem fez a comida; quando se acaba um jogo – de bilhar, ténis, seja do que for –, diz-se «obrigado pelo jogo»; quando uma pessoa se vai embora, diz «obrigado por agora»; e, quando encontra de novo uma pessoa com quem se esteve em qualquer situação de convívio, diz «obrigado pela última vez». Etc., etc., etc. Aqui na zona, que é zona rural, muita gente até agradece ao motorista, quando sai do autocarro: «Obrigado pela viagem!» Sei que tudo isto é muito semelhante nos outros países escandinavos, pelo menos, mas não sei se é exatamente igual.

Agora, todos conhecem aquela situação em que duas pessoas se cruzam num espaço estreito e uma desvia-se para a direita e a que vem no sentido contrário para a esquerda e quase chocam e desviam-se as duas para o lado contrário e esbarram de novo uma na outra e repetem a mesma coisa mais uma ou duas vezes, com uns desculpas e uns sorrisos pelo meio, até que, finalmente, lá conseguem passar…. Nessa situação, já ouvi mais que uma vez uma pessoa dizer à outra, no fim, com ar galhofeiro:

«Obrigado pela dança!» 
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Nota talvez desnecessária, para o caso de alguém ler aqui o que não era minha intenção escrever:

Este texto não é sobre cortesia. É sobre uma piada que eu vi alguém fazer na rua. E achei curioso ter já visto a mesma piada antes. Das duas, uma: ou foi por coincidência que pessoas diferentes fizeram a mesma piada, ou a piada está espalhar-se. É bem possível que eu, da próxima vez também diga «obrigado pela dança» à pessoa com que que esbarro e que hesita, como eu, no lado para que deve desviar-se. Mas não é uma expressão, nada disso. Contei o acontecido à minha mulher e ela, que nunca tinha ouvido essa piada, riu-se, naturalmente. Agora, para contar a piada, tinha de fazer uma pequena introdução ao «obrigado por» escandinavo, que é o que motiva a piada. É só isso.

Quando à cortesia propriamente dita, a minha experiência é que a cortesia é sensivelmente igual em todo o lado. Vivi em sítios muito diferentes uns dos outros, mas, se em todo o lado vi pessoas mais corteses que outras, não vi diferenças no grau geral de cortesia de uns sítios para os outros. E, no fundo, as pessoas agradecem, pedem desculpa, condoem-se e aplaudem de formas semelhantes em situações semelhantes. As variações são de superfície, de pequenas fórmulas ou rituaizinhos que fazem parte dos hábitos em certos lugares.

Os portugueses não podem agradecer e alguns agradecem de facto as mesmas coisas que os escandinavos e longe de mim ver maior cortesia nos hábitos dinamarqueses que portugueses. É certo que, em Portugal e em muitos outros países, quando se dá por terminada a refeição, não diz toda a gente, quase em coro «obrigado pela comida», como acontece aqui em todas as refeições. Se, ponhamos, dois casais passam uma tarde juntos, a fazer seja lá o que for, não é normal em Portugal dizerem, quando se separam para irem cada um para sua casa, «obrigado por hoje» ou «obrigado por esta vez», como aqui é. E, no outro dia, quando se encontram, não se cumprimentam com «obrigado por ontem», como se faz aqui. Mas não vejo que haja por essas diferençazinhas nem maior nem menor educação num ou noutro lugar.

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