22/09/18

Ora... Batatas!

A batata, que todos os europeus hoje consideram tão sua, é coisa que se come há pouco tempo na Europa – e ainda há menos tempo em Portugal que noutros países europeus, onde é um alimento de base já há mais de 200 anos.

Uma coisa que é engraçada no planalto andino, de onde as batatas são nativas, é observar-se a variedade de batatas que por lá há e que na Europa não se conhecem (embora também haja na Europa batatas muito exóticas). Costuma ser assim, não é? – no centro genético de um ser vivo, a variação é maior que nos sítios para onde ele depois se deslocou ou foi levado.

As três fotos da esquerda são de variedades andinas, mas a foto da direita é de uma variedade francesa, a Vitelotte. Todas as fotos deste artigo: Wikimedia Commons. 


Dois tipos de pisa-batatas, um utensílio
que, não sei porquê, falta em muitas 
cozinhas portuguesas,
A maior parte dos dinamarqueses comem muita batata, sobretudo cozida. Cá em casa, come-se menos que na maior parte dos outros lares, mas come-se, claro, apesar de tudo: cozida às vezes; outras vezes, salteada; às vezes em puré; muito raramente, no forno. Batatas fritas, se as fizer uma vez ao ano, é muito. Ah, estava-me a esquecer, gostamos de rösti, e faço às vezes.

De batatas cozidas e de batatas salteadas, não digo nada, porque não há nada a dizer. Relativamente ao puré, dou-vos dois pequenos conselhos: que não façam puré nem com máquinas nem com passe-vite, porque o acho melhor só esmagado com um pisa-batatas – ou simplesmente com uma chávena ou um garfo; e que não tenham medo de juntar à batata outro legume que tenham à mão; conseguem-se misturas saborosas com abóboras, curgetes, bróculos, cenouras, sei lá, muitas coisas. É uma coisa que neerlandeses e belgas fazem muito, mas eles também misturam com a batata couves e endívias, o que cá, em casa, não costumamos fazer.

Interlúdio musical: 
Ian Dury and the Blockheads, "Mash it up Harry", 1998,
uma cantiga sobre gente e batatas (?)



Batatas assadas no forno são fixes, com murros ou sem eles. Por aqui, como noutros países da Europa central e do norte, compram-se batatas muito grandes para assar no forno. Uma batata por pessoa já dá, se não se for muito glutão. Depois de assadas com casca, abre-se-lhes uma fenda longitudinal, que se enche de manteiga. Não é nada mau.

As batatas Hasselback têm o nome do restaurante de Estocolmo,
onde, em 1953, foram inventadas por by Leif Elisson
Outro tipo completamente diferente de batatas assadas são as batatas Hasselback, que eu também faço muito raramente. Se virem uma depressão oval numa tábua de cortar e se interrogarem para que serve, eis aqui a resposta: para fatiar uma batata (ou outra coisa...) sem a cortar de lado a lado. Não é que não se possa fazer sem ter uma tábua dessas, mas dá mais trabalho.

Os franceses e os belgas disputam, como se sabe, a invenção da batata frita (eis um resumo da discussão, em francês). Na falta de certezas, assentemos que nasceu algures entre Paris e Bruxelas, pronto, e não devemos andar longe da verdade. O que é importante saber sobre as batatas fritas é que têm de ser fritas em óleo limpo e sem muito sabor, e que têm sempre de ser fritas em duas vezes. É só isso.

Rösti é uma receita suíça, como quase se adivinha quando se ouve o nome (quando acaba em i, ou é suíço, como rösti ou müesli, ou quase suíço, como spätzli, não é?). São batatas raladas e depois salteadas, às vezes com bacon ou salsa, às vezes sem nada, que parecem quase um pastelão de ovos, porque o amido da batata aglutina as raspas.

Há várias maneiras de fazer rösti, é só escolherem a que mais vos agrada – ou convém. Uma maneira comum é cozer as batatas e deixá-las no frigorífico de um dia para o outro antes de as ralar (ver aqui), mas também há quem rale as batatas cruas. Eu, muitas vezes, nem uma coisa nem outra: entalo-as sem as cozer completamente e depois é que as ralo e salteio. Claro, em não estando completamente cozidas, têm de se saltear mais tempo com lume mais brando – não há nada pior que batatas mal cozidas… Agora, ultimamente, tenho feito mais uma variante menos clássica, que fica também muito boa: Ralo as batatas cruas na lâmina de ralar mais fina do robô de cozinha (com certeza que também se pode fazer à mão com um ralador muito fininho, mas nunca fiz), depois junto-lhe alho muito picadinho (aí uns três dentes por quilo de batatas), sal, mexo tudo muito bem, escorro a água que as batatas deitam e salteio depois. Os suíços haveriam de considerar um crime esta falta de ortodoxia, mas a verdade é que fica bom e, em cozinha, conta sempre mais o sabor que a tradição.

Bom proveito!

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