‘Tava com fome, fui comer, fiz ‘ma salada de couve,Indear era palavra da minha avó. Acho que era uma amálgama de idear com índio: «inventar coisas exóticas, disparatadas…» A salada de couve era uma das inovações que tinha trazido das minhas viagens. Ao contrário de outras extravagâncias minhas, a minha avó nunca a adotou. E eu também a fui esquecendo.
a minha avó chamou-m’maluco, qu’eu ‘tava sempre a indear.
Eu chamei-lhe ignorante. «’Tá bem», disse ela, «mas ouve,
Vai mas é fazer a cama, qu’a tua mãe ‘tá a chegar.»
Lembro-me muito bem de um agradável reencontro com a salada de couve num bar americano, algures nas Caraíbas, onde comi uma das melhores sandes da minha vida: coleslaw, a tal salada de couve, com corned beef, muita e cortada em fatias muito fininhas, com mostarda e molho de rábano, num excelente pão de centeio torrado (uma variação da sandes Reuben). Mas foi em Moçambique que a salada de couve se tornou um elemento constante da nossa alimentação. Importada dos países vizinhos em tempos de escassez de alimentos, a salada de couve passou a fazer da dieta de muitos moçambicanos – e da nossa.
Que mais? O que de mais importante há para dizer sobre a salada de couve, di-lo Louis Jordan na canção que vos deixo aqui mais abaixo: «Coleslaw … is just cabbage raw». É isso mesmo: seja no Arkansas ou lá onde for, é só couve crua. Mas pode desenvolver-se um pouco o assunto:
Use-se repolho ou couve coração-de-boi. De preferência, esta última, para o meu gosto. Não é que não se possa usar outra couve, mas não é a mesma coisa. Corte-se a couve em tiras muito fininhas, quanto mais fininhas, melhor. Aconselho tirar as partes grossas do centro da couve. É claro, tem de se usar uma faca de cozinha grande (normal, enfim, mas sei que há quem tenha a mania de facas pequenas…) ou então uma faca de pão, também, funciona bem.
A coleslaw propriamente dita costuma ser uma mistura de couve e cenoura ralada com maionese, mas cá em casa é raro comer-se dessa salada de couve. Normalmente, temperamos a couve cortada com azeite, vinagre balsâmico e sal, e fica assim a cozer um bocadinho no tempero. Cuidado com o sal, que a couve encolhe muito e, se uma pessoa não conta com isso, pode a salada ficar salgada. Depois, antes de servir, junta-se o que se quiser. Muitas vezes, usamos nozes, cortadas grosseiramente, e passas de arandos. Também é bom polpa de toranja aos bocados, depois de muito bem limpinha daquelas peles grossas que a envolvem. Mas, como se costuma dizer, a imaginação é o único limite.
Agora, a rainha das saladas de couve é, para mim, a salada de couve com manga e caju. Não é uma salada barata, pelo menos aqui na Dinamarca, mas vale a pena. Usem manga verde. Quer dizer, verde-verde não, mas meio verde — ainda firme e sem sumo, pronto. Podem cortá-la às tirinhas fininhas ou em lâminas também muito fininhas (feitas, por exemplo, com o descascador de batatas). O caju, escusam de o cortar.
Se a couve trabalha muito no estômago? Há quem diga que sim, um bocadinho. Paciência.
Louis Jordan, “Coles Slaw”, 1949
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