Tentativa de dizer o que não muda
Naomi Shihab Nye
Roselva diz que a única coisa que não muda
são os carris dos comboios. Tem a certeza.
O comboio muda, e muda a erva que cresce dos lados
como aranhas, mas os carris não.
Há três anos que ando a observar uma linha de comboio, diz ela,
e não dobra, não parte, não cresce.
Peter não tem a certeza. Viu uma linha abandonada
perto de Sabinas, no México, e diz que uma linha sem comboio
já não é a mesma linha. O metal tinha perdido o brilho.
A madeira estava rachada e tinham desaparecido algumas travessas.
Às terças-feiras, em Morales Street,
cortam o pescoço a uma centena de galinhas.
A viúva da casa torta
tempera a sopa com canela.
Perguntem-lhe o que é que não muda.
As estrelas explodem.
A rosa encarquilha como se tivesse as pétalas a arder.
O gato que me conhecia está enterrado debaixo do arbusto.
O apito do comboio ainda tem o mesmo som doutras eras,
mas, de cada vez que se afasta assustado
das paredes do cérebro,
leva com ele uma coisa diferente.
in Words Under the Words: Selected Poems. Portland, Oregon: Far Corner Books, 1995, trad. minha. (O poema original em inglês)
Fotografia: Russell Lee, Setembro de 1940. Caminho de ferro abandonado para uma mina abandonada. San Juan County. Quando as minas fecharam, desapareceram povoações inteiras e as respetivas indústrias (“Colorado Abandoned railroad leading to abandoned mine. San Juan County, Colorado. When the mines moved out, whole towns and affiliated industries folded up”) (daqui)
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