Há na África Austral (ou pelo menos na África Austral que eu conheço, que é África do Sul, Zimbábuè e Moçambique) palavras que não são bem de uma língua específica, mas mais património comum… Deixo-vos aqui 3 palavras que o português de Moçambique partilha com o afrikaans e com o inglês desta região – e, provavelmente, com outras línguas daqui.
Babalaze é ressaca de bebedeira. Babalaze, masculino ou feminino, e babalaza são a versão portuguesa, esta última igual à palavra ronga, babalass a versão inglesa, babalaas em afrikaans; e sei que em ndebele é babarasi e em zulu é ibhabhalazi. O mais das vezes é referida esta palavra zulu como sendo a que deu origem às outras todas. Bonita palavra, não é?, em todas estas variações…
Chamboco é instrumento para bater – vara, pau, chicote – e de chamboco fez-se chambocar, que é, claro está, vergastar ou chicotear. A palavra sjambok (pronunciada [chambok]), que é a versão afrikaans de chamboco, usa-se também em inglês. Ao que parece, a palavra vem do urdu chabuk pelo malaio samboq ou chambok. Terão sido os portugueses ou os neerlandeses a trazê-la? Ou outra gente?
Rondável, feminino, é uma casa redonda e pequena. Em inglês (escrito rondavel) e em afrikaans (escrito rondawel), a palavra designa as casas redondas típicas de algumas etnias africanas, mas pode também designar qualquer edifício com uma forma semelhante, por exemplo num complexo turístico. Em português, só a tenho ouvido empregada neste último sentido. Dizem os dicionários que a palavra é originalmente afrikaans.
Agora, duas palavras de origem portuguesa nas línguas europeias aqui à volta:
Kraal é uma palavra afrikaans usada também em inglês para designar uma aldeia de palhotas com uma vedação... ou um curral. A palavra vem, como parece óbvio, do português curral. O Concise Oxford Dictionary diz que o português foi buscar a palavra curral ao nama, uma língua da África Austral, mas os dicionários portugueses dão curral como tendo origem latina, e é isso que me parece correcto, mesmo sem ter acesso à datação das primeiras ocorrências da palavra. Como se explicaria, senão, a existência de corral em castelhano? Aliás, o Dicionário da Academia Espanhola, que é bastante fiável, propõe para corral a mesma etimologia que, por exemplo, o meu dicionário Porto Editora propõe para curral: o latim vulgar (não atestado) currale.
Uma maneira não muito simpática de designar uma criança negra é, em inglês da zona, pekkie ou pikkie. A palavra é uma abreviatura de piccanin ou piccaninny, palavras que se encontram em qualquer dicionário de inglês. O Concise Oxford Dictionary diz que piccanin entrou no inglês pelo crioulo das Antilhas e deriva do espanhol pequeño ou do português pequeno. Já um pouco identificado (mas sensato) Phillip diz, num site sul-africano de viagens, que a palavra picannin não é de origem caribenha, mas sim rodesiana, e que é muito improvável que a palavra venha do espanhol pequeño, porque os espanhóis não andaram por estas zonas, só os portugueses, pelo que a palavra deve vir de pequenino. O que eu digo é que, independentemente de ter nascido na América Central ou na África Austral, só faz sentido que a palavra venha mesmo do português pequenino, porque senão seria *piken ou *pikenye, uma coisa assim, mas nunca piccannin...
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