Descobri agora que uma compilação dos singles dos Cure comprada em La Paz, tinha, no próprio CD, marcas de negro de fumo do incêndio no nosso apartamento em Copenhaga em 2001. E eu a pensar que, exceto em meia dúzia de documentos que tivemos de guardar com páginas enegrecidas, nos tínhamos livrado de todos os vestígios físicos do fogo. Os incêndios deixam mais marcas do que nós pensamos à primeira. Ainda hoje, passados 12 anos, damos connosco às vezes a perguntar-nos onde teremos guardado isto ou aquilo, para concluir depois de alguma reflexão que o tal objeto não está guardado em lado nenhum — foi no incêndio... Mas esta descoberta fez-me pensar noutra coisa: alguns dos meus CDs têm uma história. Ou mais que uma como neste caso.
Para as novas gerações, o suporte natural da música é o computador, o tablet, o telefone ou essa vaga e gigantesca rede de computadores chamada Internet. Já não consideram natural que uma obra musical tenha um suporte individual, independente, como seja um disco, vinil ou CD, ou uma fita magnética, cassete, cartucho ou bobina. Não tomem esta nota por expressão apenas de conservadorismo. Qualquer pessoa que, como eu, se interesse muito por música e oiça muita música encontra inúmeras vantagens nos formatos digitais sem suporte físico próprio. Mas têm também duas desvantagens, acho eu: o digital não serve bem de presente e não é bom objeto de coleção.
Não tenho números disponíveis e uma reflexão assim, que não se baseia em nada mais objetivo que as minhas impressões, tem pouco ou nenhum valor; mas, tenho a ideia de que uma percentagem não desprezível das obras musicais era comprada para oferta ou, mais ou menos explicita e conscientemente, como objeto de coleção. É claro, ainda se fazem CDs e vinis (cada vez mais vinis, aliás), que podem bem satisfazer as necessidades dos colecionadores. Mas a preponderância do digital não promove, creio eu, o surgimento de novos colecionadores. Quanto ao resto, que pena que é receberem-se cada vez menos discos de prenda de anos...
Georgie Fame: "Vinyl", de Three Line Whip, 1995
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