Não é que eu não goste do meu trabalho, não é isso… Mas, se os anos de vida que me restam passarem tão devagar como eu pressinto que hão de passar estes sete meses que restam até à reforma, terei então ainda muito tempo de vida...
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| Foto de Sebleouf, licença Creative Commons, daqui. «Avenida da Reforma Tranquila». Placa toponímica falsa, uma brincadeira. Para quem não saiba francês, o «nome da comuna» lê-se como «j'ai bien bossé e j'en profite», que significa «trabalhei muito e agora disfruto disso». |
A retraite francesa é, para os portugueses, um conhecido «falso amigo», que é como se costuma chamar às palavras que, numa determinada língua, fazem lembrar palavras de outra língua (por serem cognatas ou por simples coincidência), mas significam coisas diferentes. O que é curioso é que retrete é de facto a palavra francesa, apenas com a grafia adaptada, que foi importadas para as línguas ibéricas e que ganhou aí, vá lá saber-se porquê, um sentido específico que não se lhe conhece em francês: o de sanita. A evolução é fácil de perceber: retraite significa «retirada» ou «retiro» (além de «reforma», como no título deste texto...); e, de um dos significados de «retiro», não o acontecimento mas o lugar onde este se dá, retrete fixou-se num lugar de retiro específico, tendo em seguida passado a significar um objeto central deste lugar. Duvido muito de que, em francês, retraite alguma vez tenha referido a casa de banho, e muito menos a sanita, porque o CNRTL, que costuma ser exaustivo nas suas entradas, dando também conta dos usos antigos, não o menciona.
P. S.: O CNRTL classifica vivement apenas como advérbio. É-o seguramente, quanto à sua formação e a todos os seus outros usos, mas, neste que aqui trato, porta-se como uma forma verbal impessoal, com uma estrutura semelhante (que não o significado) a uma construção como «il faut», por exemplo, requerendo um objeto direto que, no caso de ser uma proposição, vem forçosamente no conjuntivo: Vivement qu'on en finisse ! Um advérbio, defina-se como se definir, não pode exigir objetos nem orações subordinadas, não é verdade? De maneira que definir categorias das palavras em abstrato, fora das frases em que são usadas, nem sempre funciona. Já agora: um caso curioso é também oxalá em português, galego e asturo-leonês ou ojalá em castelhano, que se consideram interjeições e que se portam como aquilo que de facto são, uma oração inteira – só que uma oração árabe, tomada de empréstimo e cristalizada nas línguas ibéricas, mas que continua a funcionar na frase como o que era originalmente. Outro caso curioso é eis, de que já aqui falei uma vez.
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